Outro dia estava atendendo um casal, pais de 2 crianças com menos de 7 anos. Inteligentes, com uma bela carreira profissional, amorosos com seu parceiro, pais engajados e preocupados. Me dei conta novamente da sorte que tenho por poder trabalhar com pessoas tão especiais!
O casal relata um sábado comum: o cansaço da semana de trabalho, filhos pedindo atenção, tarefas domésticas por fazer, a frustração de ter que mudar os planos para o final de semana em função de uma viagem a trabalho de última hora. Cansaço + stress + frustração + demandas e mais demandas. A mulher começa a chorar. O homem grita. As crianças põem-se a chorar e a gritar também. Fácil imaginar a cena, não é? Quem nunca se sentiu assim que atire a primeira pedra.
Percebi a angústia dos dois: ela, querendo deixar claro que precisava colocar o choro pra fora. Ele, tentando explicar que estava tentando ajudar. Era hora de ‘traduzir’ um para o outro. Expliquei: quando a mulher sob tensão chora, ela extravasa, libera a raiva, o medo, a frustração; depois do choro, ela reencontra sua força, seu otimismo, sua capacidade de agir – mas só depois do choro. O choro é um portal – há que se passar por ele. Quando a mulher pode chorar suas angústias, ela não fica lá. Ela passa por lá e segue adiante. Se ela é impedida de chorar, ela também não chega do outro lado e não acessa a nova força. Quando ela chora, ela não precisa de receita, nem solução – na verdade, odeia que lhe ofereçam soluções. Quando ela chora, ela precisa de alguém que a ouça, para que ela mesma possa se ouvir e, ouvindo a si mesma, consiga perceber novos caminhos. O maior presente para a mulher é poder chorar, reclamar, xingar e ter alguém que a ouça, que balance a cabeça pra cima e para baixo e diga “Ahã!”, “É mesmo...” e “Entendo...” e lhe ofereça um lenço. Alguém forte o suficiente para vê-la chorar sem se desesperar; que lhe dê espaço e o direito de se sentir desse jeito, que não fique ameaçando desabar junto ou a faça sentir culpa ou vergonha por estar desmoronando. Se a mulher desmoronar, ela se reconstrói do outro lado – e mais forte. Feito tarde ensolarada depois de uma boa chuva! A chuva é fértil. O choro também. Nasce algo novo depois do choro.
Expliquei também que, quando o homem tenta deter o choro dela, ele não está sendo insensível. Ele quer resolver a questão e acha que, detendo o choro, terá de volta a mulher razoável e inteligente que ele conhece ou que, se oferecer uma solução, terá feito o que ela esperava dele. Sinto muito, rapazes, mas não é assim que funciona.
Já as mulheres, que resolvem – ou se resolvem – falando, insistem que os homens usem a mesma abordagem. Atenção, mulheres! Quando os homens querem resolver suas angústias ou problemas, eles se calam. Retiram-se para uma caverna. Ela fica perguntando (na melhor das intenções): “O que houve? Algum problema? Me conta! Fala!” porque, pra ela, falar significa liberar. Pra ele, não. Pra ele, o que resolve é ficar em silêncio, matutar. Só vai falar do problema para alguém que ele acredita poder resolver algo.
Atenção para esta diferença: para o homem, falar do problema para alguém é igual a pedir ajuda ou solução; para a mulher, falar significa ouvir a si mesma e encontrar clareza dentro de si. As motivações e as lógicas são diferentes! Esse é um destes casos onde o ditado “Faça ao outro como queres que faça a ti mesmo” é receita de frustração. É mais eficaz entender como o outro funciona e apoiá-lo nas suas necessidades.
Resumindo: quando a mulher está tensa/frustrada/irritada/angustiada, a melhor forma de apoiá-la e ajudá-la é deixá-la falar e, se ela quiser, chorar. Apenas ouça. Ela vai encontrar sua própria saída. Quando o homem estiver tenso/frustrado/irritado/angustiado, respeite o silêncio dele. Entenda que ele não está escondendo nada de você, nem se trata de falta de confiança em você. Ele apenas está procurando uma solução – e ele aceita a responsabilidade por encontrar a solução. Se ele achar que você pode ajudar, ele vai lhe dizer.
Mulheres dirão: “Mas como vou saber o que está acontecendo? Vamos ficar sem falar das coisas difíceis? Desse jeito a gente se afasta...” Sugestão: deixe a angústia dele passar; quando a situação já estiver mais calma, pergunte a ele se ele pode compartilhar com você. Explique a ele que não saber a deixa ainda mais preocupada, pois vai imaginar o pior. Quando ele estiver disposto a compartilhar, apoie o caminho que ele tiver escolhido. Se você não entender a escolha dele, pergunte o que o levou a tomar essa decisão.
Lembro do olhar de alívio da mulher ao se perceber compreendida no seu choro e o olhar de “Então é isso?!” do homem ao entender a dinâmica do choro. E os alívios e surpresas – agora trocando de lado – ao falarmos da caverna. Como é bom entender! Como é bom se sentir compreendido!
Depois da conversa, lá foram eles de volta às suas batalhas diárias. Agora, munidos de um maior entendimento um do outro e de novas ferramentas para enfrentar as provações, que virão.
Uma sessão de casal – mesmo que seja para tratar de questões das crianças – transforma-se em um momento especial, quando os adultos conseguem falar de si e cuidar desta relação preciosa. As mãos dadas deixam claro o quanto se gostam. Fica mais fácil conversar até mesmo sobre o que é difícil. E falar sobre o que é difícil, com coragem e cuidado, fortalece. Às vezes ainda dá tempo de tomar um café gostoso juntos, antes de voltar para as crianças que eles tanto amam...
Observação: Nem todas as mulheres e nem todos os homens reagem da mesma forma. Trata-se apenas de um padrão frequente, apontado por John Gray em “Homens são de Marte, Mulheres são de Vênus”, livro publicado em 1992. Somos livres para criar novos e nossos próprios jeitos... ; )
Anja Kamp
Psicóloga e Terapeuta Familiar
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