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  • Foto do escritorAnja Kamp

Educar é ...

...oferecer segurança para experimentar

Sim, sabemos que, além de amar nossos filhos, nos cabe educá-los.


Qual é a função da educação?

Nos tornar desnecessários!

Devemos educá-los para que possam viver sem nós: que saibam se cuidar, se movimentar no mundo em segurança, gerar seu próprio sustento, conviver em sociedade, zelar por sua comunidade, ter relações saudáveis e se sentir bem consigo mesmos (vulgo “ser feliz”). Esse é o projeto de médio/longo prazo – certo?


Percebo que, muitas vezes, se confunde “educar” com “ensinar” ou “dizer o que e como deve ser feito”.

Educar, na verdade, é contribuir para que a criança aprenda.

Pois “aprender” é algo ativo, não passivo. Alguém me ensinar não garante que vou aprender – pergunte a qualquer professor: a mesma aula, o mesmo conteúdo, apresentado do mesmo jeito, será absorvido por uns e não por outros; ao final de uma aula, alguns alunos terão compreendido e incorporado o conteúdo apresentado e outros, não. Cada pessoa aprende de uma maneira diferente e cada pessoa aprende de forma diferente nas diferentes fases de desenvolvimento: a criança pequena precisa da experiência concreta, enquanto a criança maior já consegue lidar com conceitos mais abstratos. Mas ambos precisam ser incorporados pelo aprendiz.


Por onde começamos?

A que devo estar atenta quando educo uma criança?


Repito, porque é importante: a criança pequena precisa da experiência concreta. Ela ainda não consegue elaborar conceitos, leis; o que você diz a ela, as suas verdades não fazem sentido. Ela precisa experimentar para então saber.


A experimentação da criança é ativada pela imitação – observando a nós, adultos, e as pessoas ao seu redor – e pela curiosidade despertada pelo que seu mundo oferece: pedras, folhas, o piso do chão, os móveis, os alimentos, os brinquedos, as ferramentas do mundo adulto – tudo desperta a curiosidade “científica” da criança, que tem o impulso natural de explorar o seu entorno e entender como tudo funciona.


Nossa função não é “explicar” o mundo para a criança.

Mas assegurar que ela esteja segura enquanto aprende.


Cabe a nós:

modelar o comportamento que desejamos que ela aprenda;

dar espaço para a experimentação;

garantir a segurança;

permitir que ela desenvolva confiança em si mesma.


Falarei sobre “modelar” e “desenvolver confiança em si mesma” em outro momento.

Hoje quero explorar como é “dar espaço” e, ao mesmo tempo, “garantir a segurança”.


Dar espaço é permitir que a criança se movimente livremente pela casa, pelo quintal, experimente os objetos da casa, olhe o que tem dentro, vire de cabeça para baixo, coloque na boca, tente equilibrar ou rearranjar as coisas. Dar espaço é a criança poder fazer as coisas no tempo dela, do jeito dela – desengonçado ou não. Dar espaço é não insistir em um “jeito certo” de fazer as coisas. Dar espaço é acolher perguntas, permitir o fluxo natural da experimentação, da criatividade, da inovação – ou da repetição, se a criança estiver testando padrões ou simplesmente se divertindo.

Dar espaço é a criança poder emitir desejos e deixá-la experimentar seus próprios limites e os limites do mundo.

Dar espaço é dar tempo à criança para observar, sentir, ouvir, descansar, entediar-se.


E é assim que a contribuímos para a sua segurança, pois na medida em que ela for conhecendo o mundo, que ela tiver consciência de quais são os seus próprios limites (porque experimentou, sentiu), que ela tiver registrado como degraus, superfícies ásperas, pedras, árvores, objetos frágeis (que quebram se não forem tratados com cuidado) funcionam, ela saberá como lidar com eles e como cuidar de si mesma no convívio com eles.


Crianças não são potenciais suicidas - crianças são pequenas exploradoras, ávidas por novas descobertas, novos aprendizados.

Quando a criança tem oportunidade de explorar o mundo, ela se responsabiliza pelo seu próprio movimento. Ela cuida de si mesma.

Quando a criança se sente constantemente vigiada e seus movimentos são contidos, impedidos, reprimidos, corrigidos, ela presta mais atenção no adulto do que nela mesma. O foco de atenção dela fica no lugar errado – como adulto que dirige olhando o celular. É perigoso.

Além disso, ela tenta constantemente escapar desta vigilância e controle, o que induz a movimentos bruscos, descuidados, de fuga – não de busca intencional e atenta.


A nossa tarefa ao criar segurança para a criança não está em conter a criança, mas em cuidar do entorno:

estar atento a objetos que a criança ainda não tem maturidade para manipular com segurança (pontiagudos, cortantes, muito delicados) e tirá-los de vista (para não despertar um desejo que não poderá ser atendido) e do alcance (para que você, adulto, também possa relaxar);

delimitar o espaço (o portão está fechado? a piscina está coberta? a varanda está fechada?) para que a criança possa se movimentar livremente e em segurança.

Ao invés de apontar para tudo que a criança não pode, onde ela não deve ir ou o que não deve fazer, conduza a atenção dela para o que é possível, está disponível, e cuja exploração será celebrada.


Segurança vem da experiência.

Por que eu não mexo com fios elétricos? Porque não tenho experiência e, portanto, seria perigoso para mim. Meu eletricista tem muita experiência e sabe manipulá-los com segurança.

Se moro numa casa com escadas ou varandas, é importante que a criança se familiarize e treine como se movimentar por elas em segurança. É mais importante que a criança tenha clareza sobre e exercite “o que fazer”, do que “o que não fazer”. O mesmo vale para piscina, riacho, animais, áreas de natureza, espaços urbanos. Acompanhe a criança e permita que ela exercite. Incentive, diga que você sabe que ela será muito competente nisso e que vai saber cuidar muito bem de si mesma.


A criança que sabe cuidar de si mesma está muito mais segura do que a criança que depende de que um adulto cuide dela. Além disso, ela tende a ser mais calma, atenta, criteriosa. Não precisa provar nada para ninguém e pode, sem problema, reconhecer que “isso eu ainda não dou conta”.


A segurança da criança não pode depender exclusivamente da presença e da atenção do adulto. Seria demasiado perigoso. É só o adulto olhar para o lado por 2 segundos e ela pode se ferir. Mas se a criança tiver a segurança de que pode explorar o mundo ao seu redor, sem necessidade de fugir do adulto, ela vai se movimentar com atenção e cuidado, mesmo quando o adulto não estiver presente ou atento.


Dar espaço à criança não é abandoná-la, nem deixá-la sozinha antes do tempo. Sim, crianças até 4-5 anos precisam de supervisão, de alguém que esteja presente e atento. Mas não precisa ficar ao seu lado o tempo todo, nem interferir na ação da criança, nem dizer a ela o que fazer. O adulto educador vela pela criança, responde eventuais perguntas, a incentiva a desenvolver suas habilidades, a faz sentir-se segura consigo mesma.


A sua criança é muito inquieta e você não confia que ela irá cuidar bem de si mesma?

Veja se é possível lhe oferecer mais espaço: mais saídas para parques e áreas verdes, delimitar um espaço na casa onde ela possa brincar sem atrapalhar os demais e sem que os outros interfiram no seu brincar; permita que ela vivencie seu impulso de expansão; a tendência é que, depois da expansão, a criança volte para si mesma, se aquiete.

Incentive a repetição: se ela gosta de subir em escadas ou árvores ou adora correr, por exemplo, convide-a a repetir o movimento muitas e muitas vezes; quanto mais habilidade ela desenvolver, maior será a sua satisfação; e isso acalma. Lembre-se: direcione e solte – não lhe cabe correr junto o tempo todo; a não ser que você queira.

Observe se você respeita o tempo dela: crianças vistas como irrequietas às vezes são muito focadas e mergulham fundo em suas fantasias; quem olha de fora, acha que nada está acontecendo e muitas vezes interfere, propondo que ela “faça alguma coisa”; neste caso, ela já está fazendo e você está atrapalhando – por isso a inquietação/irritação.


Lembre-se: educação é um projeto de longo prazo.

O resultado final não é o que a criança viveu ou aprendeu hoje.

O erro de hoje – seja um arranhão, um tombo, um brinquedo que quebrou, uma frustração – é matéria-prima de aprendizado, de consciência, de habilidades que ainda estão se construindo.

Você também teve seu tempo para aprender o que sabe hoje.

E você sabe que seus erros – incluindo decepções e experiências dolorosas –construíram quem você é hoje.

O que seus educadores e cuidadores fizeram foi velar pela sua sobrevivência enquanto você experimentava, errava, acertava, ampliava seus horizontes...

Agora é a sua vez de velar. Mas a vida é da criança. Não permita que seus medos a empobreçam, nem que sua frustração pela dor que a criança viveu hoje roube o brilho do impulso de vida, da coragem que faz tudo que é vivo ousar e querer ir sempre além!


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